“Para enfrentar o consumismo urge sermos conscientemente anticultura vigente. Há que se incorporar na vida cotidiana os quatro “erres” principais: reduzir os objetos de consumo, reutilizar os que já temos usado, reciclar os produtos dando-lhes outro fim e finalmente rejeitar o que é oferecido pelo marketing com fúria ou sutilmente para ser consumido”. [Leonardo Boff]
Jorge Elô fará intervenção urbana em Campina Grande contra o consumismo
Natasha Ikhmieniev
Alguma vez você abriu seu guarda-roupa e deu-se conta de que nada do vestuário de que dispunha no momento servia para alguma coisa? Já olhou paras as suas roupas e tem notado elas usadas, desbotadas e não vê a hora de comprar algo novo? Ou simplesmente acabou de adquirir aquele vestido maravilhoso da vitrine do Shopping Boulevard. A intervenção urbana “Ágape: Uma prática anticonsumista” do artista Jorge Elô, em parceria com a jornalista Natasha Ikhmieniev, quer mostrar que é possível, sim, vestir-se adequadamente, sem a necessidade do consumo, somente através de doações de amigos.
A ideia consiste em arrecadar roupas e acessórios de amigos, a partir dos quais serão montados quatro figurinos e o restante doado para o Grupo de Apoio ao Paciente Oncológico (Gapo) de Campina. Cada figurino composto, tarefa de Natasha Ikhmieniev, será usado pelo artista por um mês, todos os dias e envolvendo todas as tarefas profissionais e cotidianas.
Assim, somente durante o sono e os banhos Jorge não estará com a roupa prevista. No período da intervenção (abril, maio, junho e julho), Jorge Elô declamará poemas de escritores locais e nacionais mensalmente na Praça da Bandeira, abordando a temática contra o consumismo. É importante salientar que o artista já começou a se desfazer de todas as suas roupas, doando-as mais tarde para o Gapo e ficando apenas com os figurinos.
Ao final de “Ágape: Uma prática anticonsumista”, os quatro figurinos e a cobertura fotográfica do projeto serão expostos no Centro de Arte e Cultura da UEPB, que também servirá como ponto para arrecadar as doações das roupas. Além disso, o ápice do trabalho se dará quando o artista aparecer de surpresa numa festa da elite de Campina Grande, ainda a ser definida, e declamar um poema sobre a sociedade de consumo.
A intervenção assim denomina-se porque conforme Platão, Ágape, é o amor desinteressado, de doação sem espera de recompensa, o amor divino, muito relacionado com os conceitos de compaixão e caridade. Compaixão não no sentido de se sentir dó e pena do companheiro, mas no sentido de se colocar no lugar do outro e entendê-lo como uma alma em evolução humana. Igual a nós mesmos. Caridade no sentido de doar e doar-se sem esperar nada em troca. Ver o outro como uma expressão de Deus.
Diversos artistas ao saberem da iniciativa já apoiam a proposta de Jorge Elô. Poetas de CG estão mandando seus escritos sobre a temática e o artista local Jas-One já se prontificou a colocar diversos stencils pela cidade, com a imagem de divulgação da intervenção, em tamanho natural, onde Jorge aparece sem vestes, segurando apenas um livro aberto do pintor holandês Rembrandt Harmenszoon van Rijn.
Para o teólogo Leonardo Boff, a sociedade dominante é notoriamente consumista. Dá centralidade ao consumo privado, sem autolimite, como objetivo da própria sociedade e da vida das pessoas. Consome não apenas o necessário, o que é justificável, mas o supérfluo, o que questionável. Grande parte da produção se destina a gerar o que, na realidade, não precisamos para viver decentemente.
Boff aponta que sem esse espírito de rebeldia consequente contra todo tipo de manipulação do desejo e com a vontade de seguir outros caminhos ditados pela moderação, pela justa medida e pelo consumo responsável e solidário, corremos o risco de cairmos nas insídias do consumismo, aumentando o número de famintos e empobrecendo o planeta já devastado.
O clássico, o contemporâneo e o consumismo em Jorge Elô
O artista Jorge Elô jamais escondeu sua paixão pela pintura clássica, por Rembrandt, Turner e Van Gogh, entre outros. Do mesmo modo, apontou por todos os lugares em que mostrou seu talento, o vazio da arte contemporânea (veja nesse endereço o artigo escrito por ele sobre o tema), especialmente no que se refere às instalações e abstracionismo. Contudo, assumindo que não foge a sua época e tendo como pressuposto que o verdadeiro artista utiliza sua vida como a eterna produção de uma obra, idealizou a intervenção. Acerca do consumismo, há algum tempo o assunto toma a cabeça do artista, tanto que publicou ano passado um artigo no portal Paraibaonline.com.br (veja aqui).
Natural de São Paulo, Jefferson Justino de Queiroz (Jorge Elô) desenha desde a infância. Radicado em Campina Grande desde os 13 anos de idade, criou neste mesmo ano (1996) seu primeiro personagem em quadrinhos chamado Drio, influenciado pelas histórias de Calvin e Haroldo. A partir de então não parou mais de produzir, chegando a criar em 2006 um blog na internet (www.aventurasdavidacomum.blogspot.com) onde publica suas tirinhas.
Formado em História pela UEPB, Jorge Elô já enveredou por diversas outras linguagens e técnicas artísticas. Realizou uma animação intitulada “Campina Grande City” em 2008, com a qual ganhou o prêmio de melhor animação no Comunicurtas de 2010.
Ainda em 2008, realizou a exposição “Clássicos à Nanquim” no Centro de Arte e Cultura da UEPB, em Campina Grande. No ano seguinte, produziu 20 quadros para o Museu do Semiárido, localizado na UFCG. Essas obras foram expostas em 2010, no Shopping Boulevard, em Campina, e na Estação Cabo Branco, em João Pessoa.
Também em 2010 efetuou a exposição “Ensaios à Lapis de Cor”, no Cine São José, localizado em Campina Grande e participou de uma exposição coletiva de quadrinhos no Sesc Centro.
Em 2010 ainda trabalhou no filme - a ser lançado - “A Fábrica de Gravatas”, do diretor Érik Medeiros, aprovado no edital estadual Linduarte Noronha. Jorge Elô foi responsável pela pós-produção, produzindo na parte gráfica de criação de imagens em Mate Paint e como Diretor de Arte Digital.
Com duas exposições no currículo – Clássicos à Nanquim (2008 em CG) e Traços do Semiárido (2009 em CG e junho de 20010 na Estação Cabo Branco, em JP) – trabalha para, neste ano, apresentar uma nova série de dez quadros (óleo s/ tela) ainda sem título e data confirmada.
No mês passado, Jorge, Flávio Cândido, Max Kehrle e Edgar Luis lançaram o bloco carnavalesco Jacaré do Açude Velho, com frevo e antigas marchinhas, que sairá todos os anos em Campina Grande na Quarta-feira de Cinzas. Em sua primeira edição, o bloco foi um sucesso.
Atualmente, está trabalhando num projeto do Museu do Semiárido financiado pelo BNB para a construção de três dioramas (um modo de apresentação artística, de maneira muito realista, de cenas da vida real para exposição com finalidades de instrução ou entretenimento). Também integra o Coletivo WC, composto por quadrinistas paraibanos que estiveram com uma exposição no Espaço Mundo, em João Pessoa , no final do ano passado.
A Intervenção é um tipo de manifestação artística, geralmente realizada em áreas centrais de grandes cidades. Consiste em uma interação com um objeto artístico previamente existente (um monumento, por exemplo) ou com um espaço público, visando colocar em questão as percepções acerca do objeto artístico. Consiste principalmente na realização de uma performance cênica (entendam o conceito de cênico pela possibilidade de reunião de todas as artes), que tenha o lúdico como ponto central. Pode se utilizar da “Intervenção Artística” para criar expectativa concreta sobre as próximas atividades, ou como súbitos momentos criativos, estéticos e culturais durante o período de trabalho, proporcionando aos espectadores reflexões a respeito de temas específicos como valores humanos e as relações metafísicas com a vida.
Ela tem ligações com a arte conceitual e geralmente inclui uma performance. Consiste em um desafio ou, no mínimo, um comentário sobre um objeto preexistente, através de grafites, cartazes, cenas de teatro ao ar livre ou acréscimo de outros elementos plásticos, de forma a modificar o significado ou as expectativas do senso comum, quanto a esse objeto.
A intervenção é sempre inusitada, realizada a céu aberto e por ter um caráter crítico, seja do ponto de vista ideológico, político ou social, referindo-se a aspectos da vida nos grandes centros urbanos. Uma poesia embaralhada numa estação de metrô, por exemplo, é um convite para que as pessoas parem sua maratona frenética e dediquem alguns minutos para decifrar aquelas palavras. Mas as intervenções urbanas também podem ter outros alvos, como a marginalização da arte, problemas sociais, ambientais e outros.
Uma revolução contra o consumismo
Por Felipe Saldanha
Os grandes problemas ambientais de hoje não serão resolvidos sem uma revolução na cultura global. É o que diz o relatório "State of the World 2010 - Transforming Cultures: From Consumerism to Sustainability" ("Estado do Mundo 2010 - Transformando Culturas: Do Consumismo à Sustentabilidade", ainda sem versão em português), lançado no dia 12 pelo Instituto Worldwatch.
Segundo o relatório, na cultura de hoje as pessoas encontram significado e satisfação no que elas consomem, mas essa orientação cultural tem duras implicações para a sociedade e o planeta. Um cidadão de um país considerado desenvolvido, por exemplo, consome em média, todos os dias, mais do que seu próprio peso. Se todo o mundo vivesse assim, a Terra só poderia suportar 1,4 bilhões de pessoas.
Desde 1960, o consumo aumentou seis vezes, diz o relatório, citando estatísticas do Banco Mundial. Mesmo levando em conta o crescimento global da população, isso quer dizer que hoje cada pessoa consome, em média, três vezes mais que há cinquenta anos. Isso levou a aumentos similares na quantidade de recursos explorados -- seis vezes na extração de metais do solo, oito vezes no consumo de petróleo e 14 vezes no consumo de gás natural. No total, são 60 bilhões de toneladas de recursos extraídas anualmente, uma elevação de quase 50% se comparada com trinta anos atrás.
O relatório, de 244 páginas, também aponta os papéis que as diversas instituições sociais -- como a religião, o governo, os meios de comunicação, as empresas e a educação -- podem desempenhar para estimular mudanças culturais. Separadamente, seus esforços podem parecer pequenos, admite o diretor do trabalho, mas juntos podem produzir mudanças reais.
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